quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Guilherme Gonzalez: Amizades acaloradas

Guilherme Gonzalez: Amizades acaloradas

Tenho trauma de aniversário aqui. Já reservei mesa num bar para 30 pessoas, e apenas oito pintaram

O DIA
Rio - Eu vivo no Rio há três anos. Vim à Cidade Maravilhosa para investir na carreira de ator. Sempre tive muitos amigos e os encontrava regularmente, mas, por aqui, confesso, rola uma dificuldade. Para mim, um assunto recorrente: como fazer amigos no Rio? Explico.
Sei que para isso é preciso entender a cidade. Não sei traçar uma cartografia moral tampouco diferenciar as gírias entre as zonas Sul e Norte. Não vou dizer que sei como é o “calor de Madureira”, mas entendo de calor (sou de Belém. Logo, PhD no assunto). Morei na Barra, hoje, na Gávea, e meu dentista é na Tijuca. Já fui ao Vidigal — o máximo de um morro que subi. Atravesso meio mundo pra chegar ao Projac. Como carioca, se lesse minha descrição, ia pensar: “Ah, não conhece um décimo da cidade e acha que entende do ‘Rrio’ e ‘doxxss cariocaxxss’?”.
Costumo irritar seguidores de outros estados postando no Instagram fotos que dispensam filtros. Aliás, aproveito o Rio pra ficar ‘bem na foto’. É só me inserir na paisagem.
Mas tenho trauma de comemorar aniversário aqui. Já reservei mesa num bar para 30 pessoas e apenas oito pintaram, dizendo: “Só vim te dar um abraço.” Oi?? Na minha cidade, iam uns cem à minha festa. Não sou mais popular?
Malho, vou à praia e tomo açaí com banana (heresia para um paraense). A cor da pele não diz que não sou carioca. Eu me sinto da cidade. O sotaque não corresponde aos chiados. Mas me arrisco na combinação biscoito de polvilho e mate e, quando me despeço de alguém, solto um “Vou te ligar!”.
Para mim, o samba representa o Rio, mas, para outros, o funk é hino. Essa mistura é a cara do Rio. Lugar democrático. Aliás, já me acostumei a ter turmas do trabalho, da praia, da academia... Os amigos ficam divididos por lugares, quase nichos. Juntá-los no mesmo, talvez, seja quase impossível.
Hoje, eu acordei, tomei café no Parque Lage, corri na Lagoa e caminhei na orla. Pensei em visitar um amigo à noite, mas estou cansado. Fácil achar um amigo, no acaso, quando eles são separados por lugares. Começo a entender o “A gente se vê”.
Torço para fazer sol amanhã e curtir o dia. Os compromissos são quase pautados pela presença do astro-rei. Quem sabe em dias chuvosos seja mais fácil ver um amigo? Talvez uma boa tese. E antes que provoque a ira de um carioca, eu me adianto que isso é uma ironia. Talvez até uma sugestão de tema para uma marchinha no Carnaval.
Guilherme Gonzalez é ator e interpreta o paparazzo Zito em ‘Sangue Bom’

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