Moacyr Luz: Anotações de balcão
Crônica é amena, retrato do nosso comportamento. No fundo, um mínimo tratado pela manutenção dos hábitos cariocas
Rio - Longe de ter a aparência de uma equação em quadro-negro, todo dono de botequim é um mal-humorado. Da mesma tabuada, praticamente uma lei constitucional. Pra cada bar aberto, um chato. É cota. São as colunas que sustentam esse mundo onde, longe da modernidade, de virtual só o delirium provocado por abstinência ou um trago a menos.
Num passado recente, somente aos fregueses muito próximos era permitido sair com os cascos da cerveja sem pagar o ‘vale’. O dono, pano de prato no ombro, guardava uma verdadeira obsessão por esses vasilhames, engradados, no todo. Mal comparando, o sujeito leva de casa um encardido tupperware com beliscos pros amigos ouvindo uma recomendação da esposa: “Se não trouxer a vasilha de volta, tranco a porta!”
Quando o celular era apenas uma célula, o menor porção de matéria viva, linguisticamente verbalizada (compliquei?), o único telefone existente no salão era o fixo do dono mal-humorado. Fazer uso desse recurso de comunicação promovia irritação cardíaca. Cada minuto em tagarelice cegava de ira o português. Não era raro você encontrar no disco de números do aparelho, um aviso: “Três minutos, tantos merréis!” O auge da zanga, capaz de deixar o rosto Hollywood de raiva, nascia na conta: “Seu ‘Manel’, pendura o cigarro! Mais um maço e, pendura!”
O caderno em espiral, tripas de papel das folhas rasgadas em incontáveis inadimplentes do mesmo valor de um precatório, uma ação batista, e o lucro conseguido na dose de cachaça queimava no fundo desse baú de pregos.
No outro extremo (lembrei carinhosamente do nosso Papa), o chato. Sempre educado, puxa assunto com os batidos “será que vai chover?”, “que calor!”, ou outras desnecessárias observações. Permanece no óbvio. Comenta a notícia no jornal que você lê, aquela diagramada no canto da página que estava sendo virada, pede a tua opinião sobre a goleada que o seu time sofreu na véspera e ainda puxa a cadeira sem ser convidado. Oferece uma cerveja, faz questão, enchendo o teu copo sem dar espaço pra espuma, um xixi gelado. Como diz o samba: “ É gente boa, mas vacila pra caramba!”
Mesmo assim, confesso um apreço à essas duas entidades. O dono que ri demais é um alheio à sua carência etílica, ele não conhece o seu limite. Gosto de dividir olhares.
O bebedor discreto é um mistério. Um araponga dos seus porres diários. Não mostra os dentes, nem se fossem de ouro. A roupa desse freguês jamais amarrota. Nem a cara. Sai do bar mais lúcido ainda, assistindo você esbugalhado na mesa em frente. No dia seguinte, lá está o circunspecto, cabelo em gel, penteado perfeito. Já, você...
A crônica é amena, retrato do nosso comportamento. No fundo, um mínimo tratado pela manutenção dos hábitos cariocas.
Num passado recente, somente aos fregueses muito próximos era permitido sair com os cascos da cerveja sem pagar o ‘vale’. O dono, pano de prato no ombro, guardava uma verdadeira obsessão por esses vasilhames, engradados, no todo. Mal comparando, o sujeito leva de casa um encardido tupperware com beliscos pros amigos ouvindo uma recomendação da esposa: “Se não trouxer a vasilha de volta, tranco a porta!”
Quando o celular era apenas uma célula, o menor porção de matéria viva, linguisticamente verbalizada (compliquei?), o único telefone existente no salão era o fixo do dono mal-humorado. Fazer uso desse recurso de comunicação promovia irritação cardíaca. Cada minuto em tagarelice cegava de ira o português. Não era raro você encontrar no disco de números do aparelho, um aviso: “Três minutos, tantos merréis!” O auge da zanga, capaz de deixar o rosto Hollywood de raiva, nascia na conta: “Seu ‘Manel’, pendura o cigarro! Mais um maço e, pendura!”
O caderno em espiral, tripas de papel das folhas rasgadas em incontáveis inadimplentes do mesmo valor de um precatório, uma ação batista, e o lucro conseguido na dose de cachaça queimava no fundo desse baú de pregos.
No outro extremo (lembrei carinhosamente do nosso Papa), o chato. Sempre educado, puxa assunto com os batidos “será que vai chover?”, “que calor!”, ou outras desnecessárias observações. Permanece no óbvio. Comenta a notícia no jornal que você lê, aquela diagramada no canto da página que estava sendo virada, pede a tua opinião sobre a goleada que o seu time sofreu na véspera e ainda puxa a cadeira sem ser convidado. Oferece uma cerveja, faz questão, enchendo o teu copo sem dar espaço pra espuma, um xixi gelado. Como diz o samba: “ É gente boa, mas vacila pra caramba!”
Mesmo assim, confesso um apreço à essas duas entidades. O dono que ri demais é um alheio à sua carência etílica, ele não conhece o seu limite. Gosto de dividir olhares.
O bebedor discreto é um mistério. Um araponga dos seus porres diários. Não mostra os dentes, nem se fossem de ouro. A roupa desse freguês jamais amarrota. Nem a cara. Sai do bar mais lúcido ainda, assistindo você esbugalhado na mesa em frente. No dia seguinte, lá está o circunspecto, cabelo em gel, penteado perfeito. Já, você...
A crônica é amena, retrato do nosso comportamento. No fundo, um mínimo tratado pela manutenção dos hábitos cariocas.
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