sábado, 1 de junho de 2013

Jaguar: Millôr vira cartão-postal

Jaguar: Millôr vira cartão-postal

Tudo conspirou para que a festa de inauguração do banco do Millôr no Arpoador desse certo

O DIA
Rio - Tudo conspirou para que a festa de inauguração do banco do Millôr no Arpoador desse certo. Até a previsão do tempo errou. Em vez de tempo nublado com pancadas de chuva deu um luminoso crepúsculo dos deuses. Para surpresa geral, menos para Gravatá, que armou todo o lance: “Botei meus orixás para funcionar.”
Com direito a discurso: falaram Hélio, irmão mais velho; Ivan, filho; o representante do prefeito e a sempre demais Fernanda Montenegro, que leu a Biografia Mal Autorizada, texto inédito de Millôr, pelo menos para mim: “Nasci no Meyer aos 9 anos de idade. Nasci pequeno e cresci aos poucos. Primeiro me fizeram o meio e depois as pontas. Só bem mais tarde cheguei aos extremos. Cabeça, tronco e membros, não mais que isso. Mas não me revolto. Fiz três revoluções, todas perdidas. A primeira contra Deus, e ele me venceu com o truque de um milagre. A segunda contra o destino, e ele me bateu, deixando-me assim, sem entender o enredo. A terceira contra mim mesmo, e vim parar aqui. Veem o que sou? E onde estou? E por que foi? Só uma coisa é certa — já não se fazem Millôres como antigamente.
Aos 10 de idade vendi meu primeiro desenho e me tornei alvo da admiração geral (minha mãe e minha vó). Aos 15 já era famoso em várias partes do mundo, todas elas no Brasil. Sou popular por natureza, por mais que me esforce para ser hermético e profundo. Pois se chego e digo que achei um ninho de mafagatos com sete mafagafinhos, todos percebem logo que quem melhor os esmafagafizar melhor desmafagafizador será. Apesar da escola, sou, basicamente, um autodidata. Tudo que não sei sempre ignorei sozinho. Nunca ninguém me ensinou a pensar, a escrever ou a desenhar, coisa que se percebe facilmente examinando qualquer dos meus trabalhos. Creio que a terra é chata. Procuro, em vão, não sê-lo.
Creio que as paralelas se encontram nos paralelepípedos. E, como os checos, posso dizer Svoboda suverenita. Ou melhor: Za svobodu dubceka cernika. Ambas as frases, não tenho a menor ideia do que significam. Mas estou disposto a morrer por elas como tanta gente morre por outras frases que também não entendem. Aqui estou, porém feliz e tonto, vago e despreocupado. No escuro não enxergo, não entendo o que não sei, paro onde me detenho, vou e volto cheio de saudades. Pois, se fico, anseio pelo desconhecido. Se parto, rói-me a separação. Sou como toda gente.”


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