Rio -  A Agência Nacional do Cinema (Ancine) divulgou o documento ‘Filmes brasileiros com mais de 500 mil espectadores entre 1970-2012’. O levantamento, inédito, lista 456 longas-metragens que, no período, alcançaram tal audiência. Deste total, 56 tiveram como público-alvo as crianças. Embora representem apenas 12,2% do total, os filmes do gênero se destacam no ranking das melhores bilheterias. Entre os 20 primeiros longas, 11 são infantis. ‘O Trapalhão nas Minas do Rei Salomão’, de 1977, aparece em quinto lugar, com 5.786.226 pagantes.
Das 56 películas infantis, 39 são assinadas pelos Trapalhões. Dez são protagonizadas pela Xuxa, três se baseiam nas histórias da ‘Turma da Mônica’, duas contam a saga da indiazinha Tainá e, por fim, uma conta as aventuras do personagem Tio  Maneco, que, devido ao sucesso no cinema, virou seriado na antiga TV Educativa; e outra é inspirada na série de TV ‘Castelo Rá-Ti-Bum’.
Numa breve análise do levantamento, destaco três questões: a) os dados indicam que o diálogo entre a televisão e o cinema foi bastante forte. Os filmes dos Trapalhões, Xuxa e ‘Castelo Rá-Ti-Bum’, todos protagonizados por artistas de TV, representam 90% da produção cinematográfica infantil; b) as narrativas pouco se basearam na literatura infantil brasileira, reconhecida internacionalmente por sua qualidade. Somente dois filmes foram se inspirar em escritores nacionais: ‘Os Trapalhões no Auto da Compadecida’, de 1988, adaptação livre da obra ‘Auto da Compadecida’, de Ariano Suassuna; e ‘Xuxa em o Mistério de Feiurinha’, de 2009, adaptação do livro ‘O Fantástico Mistério de Feiurinha’, de Pedro Bandeira; e c) boa parte das 39 produções dos Trapalhões tentou fazer uma aproximação com histórias da literatura universal. É o caso de ‘Ali Babá e os 40 Ladrões’, de 1972; ‘Robin Hood e o Trapalhão da Floresta’, de 1974; ‘Aladim e a Lâmpada Maravilhosa’, de 1974; e ‘Os Trapalhões e o Mágico de Oroz’, de 1984.
A constatação, enfim, não é a das melhores: o levantamento da Ancine revela que o cinema infantil, diante da potencialidade de sua linguagem, ofereceu e continua oferecendo muito pouco de diversidade e cultura nacional para nossas crianças. E o mais grave: parece que nada de novo vem por aí.
Professor e jornalista especializado em Educação e Mídia