Rio -  Há duas semanas, chegou a primeira tiragem do disco ‘Dois Compassos’, minha parceria com o veterano compositor Delcio Carvalho. O disco tem quase a metade de suas canções composta por clássicos consagrados do Delcio e seus parceiros, repaginados com arranjos meus e também com a preciosa colaboração do Arthur Maia, baixista e produtor, meu parceiro na produção do CD. A outra metade é composta por canções minhas, inéditas, e ainda têm duas canções que fizemos em parceria, eu e D. Carvalho.
O processo deste trabalho me fez reviver uma coisa que me instiga há muito tempo: como um compositor tão precioso como o Delcio, hoje com 74 anos, assim como vários outros conhecidos por todos nós, não tem o reconhecimento artístico que merece?
Talvez a produção do ‘Dois Compassos’ tenha me dado algumas respostas. No entanto, outras interrogações continuam pairando. Me refiro agora à extensa gama de compositores brasileiros que morreram pobres e, alguns, desconhecidos, não tiveram um reconhecimento, ou pelo menos uma justa remuneração de sua obra, em vida.
Está certo que a vida de muitos compositores é um tanto quanto desregrada, com certa ‘irresponsabilidade’, se olhados pelos olhos convencionais da sociedade. No entanto, é importante lembrar, são estes compositores que têm o poder de fazer a mais linda poesia musicada a respeito dos mais simples acontecimentos cotidianos de nossas vidas. E isso tem, sim, valor! Porque o Brasil é um país que possui, em suas canções, a trilha sonora da vida de milhões de brasileiros, e colabora, sim, com nossa identidade cultural. É ou não é?
Então, não seria o caso de instituições governamentais, cientes da importância ‘imaterial’ destes caras, do importante efeito que eles provocam na ‘subjetividade’ da nação, criarem programas específicos, de apoio a alguns compositores e intérpretes já em idade avançada, cuidadosamente selecionados? Pelo menos um pouco, é melhor do que nada! Hum...Ihh...sei não, acho que o problema está nas palavras ‘imaterial’ e ‘subjetividade’, muito distantes de uma realidade agressivamente capitalista (e política, no sentido nefasto da palavra), a tal ponto de não sobrar tempo nem energia para se pensar longe, apenas para resolver o que está bem perto, na cara, no cotidiano. Cotidiano que, por outro lado e ritmo de funcionamento, é tão belamente descrito por nossos compositores do passado e do presente.
Marcelo Guima é compositor e cantor