Rio -  Quando você era criança, vivia a vida em ‘piloto automático’. As coisas aconteciam, e você navegava conforme a maré — até os seus medos eram lúdicos, e suas reações eram quase instintivas.
Um dia, você cresceu, e esse instinto evoluiu vagarosamente para um estado de profunda intuição: foi quando você sentiu que era responsável pelos seus atos. Cada passo precisava ser milimetricamente calculado e seus medos deixaram de ser lúdicos.
Hoje, você vai ao Rock n’ Rio ou ao Maracanã e percebe que é mais um na multidão. A impressão é que o mundo não se importa com você e que na guerra da vida seu nome é só um número nos registros do Censo.
Mas de repente, a seleção brasileira marca um gol, e o seu guitarrista favorito toca um riff alucinante. Você percebe que é o protagonista de um momento inesquecível. Foi pra você que o jogador de futebol fez a melhor jogada e o guitarrista fez o melhor som. O seu grito nesse momento é mais do que bem vindo, é fundamental.
Diante do espelho, você se lembra que já se apaixonou, que ganhou comidinha especial no aniversário, que teve um cãozinho, que o seu irmãozinho te idolatra e que tem grandes amigos. Quem disse que você não é especial? Quem disse que você é apenas um na multidão?
Aquele velho instinto que virou intuição se metamorfoseia e se transforma em consciência — estado pleno de autoconhecimento — diploma para pilotar a vida. Você sente que não está mais no ‘piloto automático’ e que, apesar do medo, é capaz de seguir em frente.
Consciente de seu protagonismo, mil amores virão, mil aniversários se revelarão, mil irmãos te beijarão, mil gols e riffs ecoarão. E prepare-se para aplausos e vaias, pois plateia é algo que não nos falta nessa vida.
João Pedro Roriz é escritor e jornalista. Autor de ‘Almanaque da Cidadania’