Rio -  Bebeto vai participar da primeira partida do novo Maracanã. Seus amigos, entre eles o filho Mattheus e Romário, contra os de Ronaldo retomam, depois de amanhã, às 19h, uma história na qual o ex-camisa 7 da Seleção tem lugar de destaque. Um dos dez maiores artilheiros do estádio elege o gol de voleio sobre a Argentina, na vitória brasileira por 2 a 0, pela Copa América de 1989, como o seu mais bonito. O título daquele ano, em casa, o faz imaginar como seria disputar uma Copa no próprio país. Como foi em 1998 para a França. Na ocasião, o Brasil perdeu por 3 a 0. Bebeto estava lá e dá sua versão do episódio da convulsão de Ronaldo.
'Quando entro no Maracanã é para fazer gol. Pode cobrar', diz Bebeto | Foto: Carlos Moraes / agência O Dia
'Quando entro no Maracanã é para fazer gol. Pode cobrar', diz Bebeto | Foto: Carlos Moraes / agência O Dia
O DIA: Você consegue escolher o seu grande momento no Maracanã?

Bebeto:  Foram tantos... O Maracanã era o meu maior palco. Eu me transformava. Entrava sempre com esse pensamento: ‘Vou ter que fazer o gol’. Tive momentos maravilhosos. Mas eu vou botar a Copa América de 1989. Eu não tive a felicidade de disputar uma Copa do Mundo aqui e eu disputei uma Copa América. Sou membro do COL, e todas as vezes que me colocam para falar, eu fico me imaginando disputando uma Copa do Mundo aqui. Eu estaria metendo gol, fazendo de tudo para conquistar esse campeonato. Eu acho que é dessa maneira que os jogadores do Brasil vão encarar.

O DIA: Você vai participar do primeiro evento-teste...

Bebeto: Vou lá fazer meus golzinhos, pode ter certeza.

O DIA: Está ansioso?

Bebeto:  Estou. Eu joguei em Wembley, fiz gol. Joguei no Camp Nou, no Bernabéu, mas o Maracanã é uma coisa muito forte. Quando eu era criança, eu ia ao cinema, passava antes dos filmes o ‘Canal 100’. Eu ficava imaginando, vendo o Zico, o Adílio, aquele pessoal, no Maracanã, fazendo gol, eu dizia: ‘Meu Deus, um dia eu vou jogar e fazer gol ali’. Quando eu joguei no Maracanã eu estava realizando um sonho de criança. Eu tinha 10, 12 anos. Sempre tive o Zico como ídolo. O Maracanã é o maior palco de todos os tempos. Eu quero vê-lo lindo, com o melhor gramado.

O DIA: Você lembra da primeira vez em que jogou lá?

Bebeto: Estava chovendo. Foi Flamengo e Tiradentes, pelo Campeonato Brasileiro, em 1983. Tenho a camisa até hoje, era toda furadinha, número 14. Está intacta. Eu me emocionei pra caramba. Não tinha muita gente porque estava chovendo demais. Eu estreei com o Zico, na primeira bola fiz a tabelinha com o meu ídolo. Estava realizando um sonho de criança. Quase faço um gol. Entrei com muita vontade, fui assinar a súmula e escorreguei. Quase caí.

O DIA: Você teve o privilégio de ser campeão com ele, em 1987...

Bebeto: Essa imagem está na minha cabeça até hoje. Quando eu fiz o gol (do título, sobre o Internacional), o primeiro a me abraçar foi ele. Realizei o sonho. Desde criança, sempre me espelhei no Zico. Depois, conviver com ele, treinar com ele e ser campeão com ele foram emoções muito grandes. Começo a falar e passa um filme na cabeça.

O DIA: Teve alguma torcida que mexeu mais com você?

Bebeto:  Flamengo é Flamengo. A torcida é impressionante. Mas eu tenho uma história do Vasco e uma do Botafogo. A do Vasco, quando o Roberto me pediu para eu trazer o La Coruña para jogar a despedida dele no Maracanã. Fiz o gol, e a torcida do Vasco gritou o meu nome, vibrando com o meu gol. Eu nunca vi aquilo na minha vida. A outra do Botafogo que lotou o Maracanã, contra o Juventude, eu não consegui fazer um gol naquele dia. Quando eu vi aquele estádio cheio, o Maracanã lotado só com a torcida do Botafogo... E o Flamengo é o 12º jogador. Quando a torcida gritava: ‘Oh, meu Mengão, eu gosto...’ Arrepiava.

O DIA: A sua parceria com o Romário é muito comentada, até pela Copa do Mundo. Mas quem foi seu maior parceiro do Maracanã?

Bebeto: Eu tive muitos. No Maracanã, eu acho que Renato Gaúcho. Jogava na frente comigo. O Zinho me ajudava demais. Esses dois foram importantíssimos para mim. Fizemos uma grande dupla também com o Renato (Carioca), fiz gol pra caramba com ele. O Adílio não posso falar, que jogava mais no meio, mas fiz muitos gols com ele também.
'No cinema passava o Canal 100 e eu ficava vendo o Zico e o Adílio no Maracanã' | Foto: Carlos Moraes / Agência O Dia
'No cinema passava o Canal 100 e eu ficava vendo o Zico e o Adílio no Maracanã' | Foto: Carlos Moraes / Agência O Dia
O DIA: O gol contra a Argentina foi o seu mais bonito no Maracanã?

Bebeto: Gol de voleio não tem jeito. E na Argentina de Maradona. Maradona para mim foi um dos maiores jogadores que eu vi jogar. E nesse dia o Maradona veio trocar a camisa dele comigo, pelo gol que eu tinha feito. Até hoje eu tenho a camisa do Maradona. Ele disse: ‘Nunca vi um gol tão bonito’. Era marca registrada. Fazia desde criança. Hoje quando tem gol desse tipo, dizem: ‘À la Bebeto’. Até isso consegui fazer no futebol, ter um gol que todo mundo se lembre de mim.  

O DIA: Você vai jogar na reabertura do Maracanã. Vai colocar o Mattheus?

Bebeto: Vou botar. Ele está se escalando: ‘Pô, nunca joguei no Maracanã’. E tenho certeza que ele ainda vai brilhar muito lá. Estou me preparando. Fiquei uma semana sem treinar com conjuntivite. Fico mal. Comecei a pedalar, dar a minha corridinha. Dia 27 vão me ver correndo e metendo gol. Quando entro no Maracanã é para fazer gol. Não tem outra história. Pode cobrar, que vai ter gol, não tem jeito.

O DIA: E se for com passe do Mattheus?

Bebeto: Pode ter certeza que ele mete umas bolinhas. Vamos estar eu e o Baixinho (Romário), né? Não vou chamar o Baixinho? Pelo amor de Deus. Já falei: ‘Se prepara!’.

O DIA: Se fizer gol com passe do Mattheus, vai pegar ele no colo para relembrar o gol na Copa de 1994?

Bebeto: O Mattheus já está com 1,87 metro. Na hora a gente vê que vai sair alguma coisa (comemoração especial). Fui jogar amigos do Bebeto contra amigos do Raí. Jogamos eu, Zico, Mattheus no Engenhão. O Mattheus pegava a bola e metia para mim. O Zico falou na TV que o Mattheus só jogava bola no Bebeto. Eu falei: ‘Qual é, Galo, pelo amor de Deus, eu estou metendo um monte bola para você’. Ele disse que estava uma panela danada entre Mattheus, Zinho e eu. Muito engraçado. Foi uma emoção danada.

O DIA: Você viu a França ser campeã em casa. Consegue imaginar como seria se fosse o Brasil?

Bebeto: O brasileiro acho que é mais fanático. Sei lá. Mas o resultado teria sido outro se não tivesse acontecido o problema do Ronaldo. Foi no dia, arrebentou com a gente. Fiquei preocupado com a saúde do Ronaldo. Falei com o presidente, Ricardo Teixeira: ‘O Ronaldo não tem condição de jogar. Copa do Mundo tem de quatro em quatro anos. A saúde do Ronaldo...’. O maluco do Edmundo saiu gritando: ‘Doutor, corre aqui, o Ronaldo está morrendo’. Diz que foi uma coisa horrível. Na preleção, o Zagallo chorando, dizendo: ‘vamos dar esse título para o Ronaldo’. No vestiário, todo mundo de roupa trocada, entra o Ronaldo, chorando: ‘Zagallo, deixa eu jogar, pelo amor de Deus!’. A gente viu aquilo tudo. Reuniram-se o presidente, Ronaldo, doutores e o Zagallo. O Zagallo disse: ‘Edmundo, você espera que o Ronaldo vai jogar’. O maluco do Edmundo jogou a camisa no chão. Que confusão! O resultado, não desmerecendo o título da França, seria outro com certeza. Não tenho dúvida disso.