Rio -  O Banco Imobiliário com obras do prefeito Eduardo Paes pode ser considerado mais do que um marketing político. A enxurrada de críticas que vem sendo feita na internet levanta a questão para o fato de que a brincadeiracom crianças pode trazer visões equivocadas sobre a realidade.

Uma delas é a punição para o jogador que cair com o peão na casa “doação para projeto social”. Neste caso, $ 200.000 são descontados do participante na rodada.

“Isso produz um ser humano que vê políticas compensatórias, de apoio à pobreza, como esmola. E o governo erra ao fazer isso. Ele está treinando crianças e adolescentes para enxergarem iniciativas em favor de minorias como algo desnecessário, que, por isso, merece punição. A visão pedagógica é equivocada”, afirmou o sociólogo e professor da UFRJ Paulo Baía.
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Tabuleiro do Banco Imobiliário na versão da prefeitura carioca, que tem despertado críticas de especialistas a respeito de suposto uso político do jogo entre os estudantes da rede municipal de ensino | Foto: Reprodução
No jogo, a promoção dos empreendimentos de Paes é inquestionável. Uma das cartas de “Sorte” informa ao jogador que ele vai se mudar para o Bairro Carioca — conjunto habitacional, em Triagem, que foi inaugurado no ano passado pelo prefeito.

A outra boa notícia que pode sair é que o BRT — corredor de ônibus — vai chegar ao bairro de quem está na partida e, com isso, poderá ser feita economia na passagem.

Estranhamente, um Revés — o que significa perder dinheiro no jogo — é a compra de ingressos especiais para a Copa de 2014. Nesta sexta-feira, o Ministério Público informou que está na 8ª Promotoria de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania um procedimento para analisar a compra do jogo pelo município.

A prefeitura diz que liberou o uso da marca Cidade Olímpica para a Estrela e, como achou o produto interessante, encomendou 20 mil Bancos Imobiliários para os estudantes da rede. Além da cessão do uso da imagem, o município pagou R$ 1.050.748 pelos jogos.

Nova discussão na sala de aula

A repercussão do jogo chegou às salas de aulas, mas agora de outra maneira. Vai virar tema de discussão. É o que vai fazer, por exemplo, o professor José Teixeira, que pretende levar aos seus alunos, do 6º anos do Ensino Fundamental até o Ensino Médio, a questão, que resiste no país e no mundo, de políticos misturarem o público com o privado.

“Estou trabalhando como isso acontece e cria, em algumas situações, radicalismo no poder. É importante que os estudantes tenham consciência de que a máquina pública não deve servir à iniciativa privada”.
Bate-boca no Twitter
O secretário municipal de Cultura, Sérgio Sá Leitão, bateu boca com seguidores ao tentar defender o uso do jogo nas escolas. “É uma iniciativa fantástica de promoção da cidade. Inovadora e com amplo alcance. Chega de patrulha e caretice!”, escreveu ele, que foi provocado com a frase: “banco imobiliário que apresenta aparelhos e serviços públicos como empresas lucrativas é um absurdo”.

Rapidamente, um outro internauta entrou na discussão e respondeu ao secretário: “Faça inovação com seu dinheiro”. Sérgio, então, postou: “Você tem uma visão estreita e arcaica do papel do poder público”.
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O secretário Sérgio Sá Leitão defende o novo Banco Imobiliário | Foto: Reprodução Internet
Em dezembro, Sérgio escreveu no Twitter “Quem teve a ideia de fazer este Banco Imobiliário Cidade Olímpica é um gênio”.

Versão de mentirinha vira febre na Internet

A revelação do jogo com as obras da prefeitura provocou uma verdadeira febre no Twitter. Como se vê no quadro nesta página, os usuários estão fazendo brincadeiras com as cartas “Sorte e Revés” associando-as a problemas de infraestrutura, segurança e serviços na cidade e no Estado.
A
s mensagens também criticam o preço dos imóveis do Rio: “Especulação imobiliária te empurrou para área de risco e mudanças climáticas aumentaram ao extremo.

Perca tudo no próximo deslizamento”. Ou ao dinheiro dado pela prefeitura às escolas de samba: “Você é presidente de escola especial. Ganhe R$ 1 milhão sem precisar prestar contas”.
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Há quem lembrasse também os bueiros-vulcões, que em 2011 deixaram os cariocas em pânico. “Um bueiro em Nossa Senhora de Copacabana explodiu e caiu em cima do capô do seu carro. Volte 10 casas ”, twittou Fagner Torres.

Outro internauta, identificado como Gaúcha da Colina, lembrou o ex-prefeito Cesar Maia, que agora é vereador e pediu na Câmara explicações sobre ações na gestão de Paes: “Ex-prefeito entra com 53 atos legislativos para te pentelhar. Volte 2 casas”.

Internautas: abaixo-assinado para tirar jogo do mercado

Um abaixo-assinado, que está sendo feito por internautas, pede o recolhimento do jogo das obras de Eduardo Paes nas escolas do município. A Prefeitura do Rio, no entanto, já informou que continuará adotando a edição do polêmico Banco Imobiliário na rede de ensino.
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Discrepância entre valores de aluguéis no Rio, que simulariam a realidade, intrigou educadores | Foto: Reprodução
Autor do documento que circula no Facebook, o universitário e militante da ONG Meu Rio, Rafael Rezende, 19 anos, acredita que a pressão feita pelo número de adesões possa motivar também a Estrela a repensar sobre a fabricação do banco versão “Cidade Olímpica”.

Até o início da noite desta sexta-feira, mais de 700 pessoas já tinham aderido ao movimento. Na página do Facebook da Estrela, um texto padrão está sendo replicado pelos internautas . Num dos trechos, está escrito: “Espaços urbanos, equipamentos e serviços públicos da cidade não são brinquedos e muito menos negócios altamente lucrativos para seus proprietários. E isso não deveria, de maneira alguma, ser ensinado para crianças.Exigimos que os jogos sejam retirados imediatamente de circulação”.

Procurada, a Estrela informou que não vai mais se pronunciar sobre o assunto. A edição especial "Cidade Olímpica" chegaria às lojas em maio — a preço sugerido de R$ 99,90.
Um dos argumentos seria levar os alunos a conhecer melhor a cidade do Rio e de ser um jogo de “importância pedagógica”