Moacyr Luz: Os sonhos de uma virada
Rio - O rapaz se aproxima, me oferece os jornais do dia, algumas revistas de celebridades, outras sobre novelas e seus protagonistas. Diante da recusa, puxa um assunto:
— É doutor, eu queria ser pobre por um dia...
— Como assim?, devolvo o devaneio.
— É que ser pobre todos os dias tá muito difícil, patrão. É brabeira!
São sonhos de um pobre como eu.
A geladeira do anúncio está repleta de supérfluos. Compartimentos adornados de champagnes, juice oranges e uma gelatina intocada na prateleira central.
As mulheres têm dentes alvos, reluzentes. Os marmanjos, do outro lado, esculpidos feito lanternagem no martelo. Nada de Fogo Paulista, genebra ou batida de limão da casa. Nem hálito, alguns deles exalam.
Sonhar não custa nada.
O ‘cogumelo’ de luzes sobre o negro da noite ilumina a esperança de cada um.
— Parada?
— Sim! Desde quando fundada... Quem anda são carros!
Sai gargalhando entre as barracas, pisando bailarino, quase incorporado, nas areias da distante praia do litoral fluminense.
Eu espero, mesmo depois das chuvas, manter o astral que rege o Rio, afinal, somos os anfitriões do Brasil.
Os sonhos continuam: meu time ser campeão; saúde compatível aos botequins, amores e amizades.
Hoje é Dia de Reis, hora de guardar a árvore do nascimento e ouvir folias e ladainhas, entre as fantasias coloridas da troupe religiosa.
Peço a conta. O ‘pequeno jornaleiro’ está na barraca ao lado:
— O senhor sabia que o caminhão de bebidas acabou de virar ali na esquina?
— Não brinca? Machucou alguém?
— Nada! Virou pra outra rua e foi embora, vazio!
E-mail: moacyrluz@ig.com.br
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