Realizada no ano passado, a primeira edição do Festival Novas Frequências levantou uma interessante questão que gostaria de compartilhar. Até porque o festival aconteceu de novo este mês e o assunto sempre surge novamente.
Pois bem. Quem se apresentava era o mexicano Murcof, um dos mais respeitados artistas de música ambiente do mundo. Traduzindo para a música as paisagens sonoras dos desertos mexicanos ou então trilhando filmes ou outras encomendas de artistas visuais, Murcof consegue passear como poucos pela música clássica e pelo techno, aplicando cordas, guitarras e diversos efeitos. Simultaneamente, maestro e orquestra.
A apresentação foi polêmica. De um lado, aqueles que a amaram. Do outro, aqueles que acharam a “parte musical” absolutamente genial, mas que odiaram a “parte performática” da mesma. Explico melhor. Para essas pessoas, se apresentar sozinho por trás de um computador sem nenhum tipo de acompanhamento visual ou gestual é simplesmente “não-performático”. Segundo essa parcela da plateia, um show precisa de algo a mais para ser um show. Senão, vira mera audição. “Fica chato”. Precisamos aprender a ouvir. Estamos tão acostumados com distrações visuais em nosso cotidiano que a “parte musical” de um show ou de uma apresentação é praticamente detalhe. Será mesmo que precisamos de luz, vídeos, caras & bocas, glúteos e pirotecnias para apreciar uma apresentação mais intimista? Aliás, nossos olhos realmente precisam olhar para alguma coisa em um show de música? O som não é suficiente?
A performance (sim, performance) sen-sa-cio-nal do artista norte-americano Kevin Drumm na casa de shows em Botafogo Audio Rebel teria sido mais impactante se ele desse uma de Girl Talk (lembram dele no saudoso Tim Festival de 2007?), e tirasse a camisa, subisse na mesa e batesse cabeça? Acho isso engraçado e ao mesmo tempo digno de análise, pois considero a música, assim como a literatura, algo extremamente visual. Cinema é vida, mas enquanto leio um livro, dirijo cenas do meu próprio filme.
Vivemos um bombardeio imagético, sensorial e informativo tamanho, que experiências sonoras de música pela música devem ser mais estimuladas pela produção cultural brasileira. Sabe um exercício estimulante? Apague a luz, feche os olhos e escute. Você vai ouvir (e ver) coisas que nunca ouviu (e viu) antes. Escutar música é uma baita experiência. Afinal de contas, já dizia Nietzsche, sem música a vida seria um erro.
Chico Dub é idealizador do Novas Frequências e um dos curadores do Sónar SP